terça-feira, 6 de dezembro de 2011

Gustavo, apresento-me

A data estava marcada com hora incerta para o momento final. 
No entanto, eram exactamente meio-dia, do dia 24 de Maio de 2002, quando me foi pedido para entrar numa sala e aguardar.
Era a primeira vez, desconhecia por completo aquele ambiente, era como se estivesse de olhos vendados. O lugar era frio, sinistro e deveras impressionante, ambiente propicio a meditação e pensamento. 
Não estava sozinho, mas sentia-me só, estou acompanhado com mais duas pessoas que não conheço mas que esperam pelo mesmo acontecimento. Envolvidos todos na mística que nos rodeia, não conseguíamos disfarçar o nervosismo que impera neste espaço.
Sozinho na minha espera, a ansiedade apoderou-se de mim, pensei por longos momentos, que tudo iria mudar na minha vida e o quanto prestes estava para acontecer. Estou a breves momentos, de triplicar a responsabilidade que faz de mim um homem de bons costumes e com o dever de transmitir aos outros valores sociais tão importantes como a justiça, respeito, honestidade e rectidão. 
Ruídos estranhos e barulhos constantes rompem pelas brechas da porta que me separa da acção, .…. são ecos longínquos que vão despertando os meus medos e receios. 
Algum tempo depois, entra alguém com um formulário de poucas e concretas perguntas para preencher. Sentei-me na mesa colocada de frente do janelão espelhado, aproximando-me do candeeiro com lâmpadas em forma de vela para que a escrita fosse perfeita. Á medida que preenchia a minha mente refugiava-se em Deus e na minha Família. Naquele momento nada era importante, dinheiro, bens materiais e tempo, eram coisas fúteis, a situação assim o proporcionava, era só eu e os meus pensamentos de reflexão para com o mundo, na esperança que tudo corresse bem. 

Tudo o que queria saber, era o que se passava lá fora ou lá dentro, perto do acontecimento, pensava em tudo e em todos, dava a volta ao meu mundo num curto espaço de tempo, como se estivesse a definir e redefinir a minha pessoa. Estava a acusar a responsabilidade de nove meses de preparação para um novo amanhã. 
Também pensava em todas as pessoas do mundo, pessoas com dificuldades, pessoas que nunca lhes foi dado uma oportunidade para sorrir como eu espero sorrir, pessoas que levaram uma vida recta e nunca puderam saborear uma situação fraternal. Enfim, pessoas de outro contexto, com vidas complicadas. 
Estava na eminência de alterar a minha vida, iriam chamar-me a qualquer instante e não sei se estou preparado para agarrar o que me espera ou para o que esperam de mim. Mas naquele momento estava decidido a consolidar tudo o que de bom me ensinaram para ser capaz de o difundir junto dos que amo. O relógio era o objecto, entre os outros da sala, o mais olhado, as horas pareciam intermináveis, tornando-me pequenino por não poder de controlar o momento. São nestas alturas que damos valor ao que temos e ao que queremos manter a todo custo, pois nada é garantido, tudo é efémero. Percebemos que a vida é uma passagem e todas as decisões tomadas definem-te o homem que és. Encontras-te num momento de auto-critica, deveras pesado para quem vai assumir um novo cargo na sociedade. 

Eis que sou chamado, cego pela escuridão e sem noção do espaço pelo qual caminho, aproximo-me daquilo que hoje sei ser, o lugar do acontecimento, trémulo e sem controlo no discurso, fui respondendo e validando as informações que apresentei anteriormente, e tentando discretamente saber o que se estava a passar de forma a confortar-me. 
Sentia um ambiente carregado de pressão sobre mim, como se me estivessem a avaliar na prova da minha vida, e continuavam a não me dar novidades, só queria era que tudo terminasse em bem.
De volta á câmara ou á sala de espera da maternidade, já não tenho posição de estar, os ruídos continuam do outro lado da porta,, e agora sinto que estou perto de o ver, passado algum tempo, a hora da verdade chegou. 

É meia-noite, chamaram-me e mostraram-me a Luz da minha vida.  
Eu tornara-me Pai de um menino que acabou de nascer com 3,4kg de seu nome Gustavo.
Curiosamente, passado 3 anos, passei pela mesma prova de fogo, desta vez de um modo diferente. Fui convidado a nascer de novo, aprendendo a trabalhar espiritualmente e a comungar de uma elite, onde todos os valores que tento transmitir são as colunas do meu carácter, Liberdade, Igualdade e Fraternidade. 
Hoje todos os meus irmãos me reconhecem como …. Gustavo.

Autor: Gustavo

1 comentário:

Anónimo disse...

Brilhante a comparação!